25 de janeiro de 2010

13 de janeiro de 2010

COLÓQUIO DE NOITE QUENTE

-“Não é tão difícil assim quanto parece.” Disse ele em seu primeiro contato com tudo aquilo que lhe surpreendia na quente noite de sexta-feira. Tudo que queria era ter a certeza de que estava fitando os olhos pelos locais certos. E realmente estava. Chegara junto com seus amigos – que outrora o procuraram por precisar de ajuda – e observava tudo ao seu redor, como de costume. As vestes não eram as mesmas de outras ocasiões. Eram sim, as mais estranhas com as quais havia adentrado aquele recinto. A camisa, não era a costumeira, mas sim a sua pólo vermelha, já meio velhinha, mas que o agradava muito; a calça jeans já contava com um grande rasgo no lado esquerdo, bem em cima da costura. Isso já não era problema, dava certo estilo (só na visão dele). O sapato, bem, o sapato... Não era aquele de costume, mas o seu bom azul e branco cintilante. Apesar de tudo ele se sentia um estranho no ninho retornando àquele local, pensou que seria mais natural.
Aos poucos, outras faces conhecidas foram dando as caras, e tornando tudo um pouco mais amigável. Quem pensava em ir embora apenas vinte minutos após a chegada, começava a pensar em até quando poderia ficar contemplando a sua alegria temporária.
Os copos sempre se enchendo, ou mantendo-se cheios, e os risos davam conta da descontração, em conjunto com as piadas infames e comentários maldosos a respeito dos presentes. A música local já fazia com que vibrassem as vestes de todos no local, agradava por sua qualidade e ao mesmo tempo não era entendida por quase ninguém. O importante é que todos estavam ali, se divertindo, e, convenhamos, alguns de maneira muito intrigante. Pense só em um bando de homens descamisados e suados, formando uma roda e se abraçando ao som estridente de baixos e guitarras. Não era sua concepção ideal de diversão.
Mas foi bem quando algo que era raro de se ver desceu a escada que dava acesso à pista. Portava suas calças jeans simples, sua camisetinha amarela (não menos simples), e os cabelos bem do jeito que ele gostava. Curtos e repicados, mais longos na parte da frente. Negros. Só então se deu conta que da certeza de fitar os olhos pelos locais corretos. Intrigado por tal presença resolveu começar a sua comumente efetuada investigação, porém não via ninguém que pudesse ser o seu “caro Watson” por perto. Necessitar de alguém ali era a mesma coisa que pular da banqueta, quando condenado à forca. Sendo assim, fez algo de extrema raridade, deixou que tudo tomasse seu curso natural, e não custou muito até que ele o levasse onde queria, como se fosse uma pequena canoa sendo levada pela correnteza de um rio.  Dos rostos conhecidos que adentravam o local, alguns três ou quatro contavam com certa proximidade à moça. Pensara então: “Estão aqui meus Watsons!” Mas com seu jeito retraído e desconfiado voltava logo atrás: “Não, vejo ali apenas os punhais preparando seu bote.” Eis que entre um pensamento e outro, viera o que há pouco era seu concunhado com a abertura do colóquio:
-Belas visões têm daqui, compadre.
-É, de acordo. Tendo em vista que nos colocamos em meio a tantas atrocidades.
-Tens de ver que já se passa uns tantos das trinta primaveras, então tem uma bela vista, ainda assim.
-Seus tantos que passam são mais de uma primavera completa? – indagou surpreso.
-Não. – respondeu-lhe o compadre.
-Pois bem, não me preocupo com as primaveras que já lha pertencem, pois mesmo o que lhe fala conta com suas vinte e sete quase completas, e não se acha em final de curso, nem mesmo incapaz de oferecer algo que seja de bom grado à moça.
-Dou-lhe toda a sorte desta galáxia se queres repousar naquele chinelo, pés cansados – apoiou mais uma vez o compadre.
Coisas cada vez mais especiais passavam-se em sua mente fria e ardilosa. Era uma questão de tempo para que os seus gatilhos agissem rápido. Topadas aconteciam, devido à proximidade empregada, mas como se fosse nada agia, e com isso ia ganhando espaço – há mulheres que não suportam quando um homem desmerece sua presença – pois toda vez olhava em quarenta e cinco graus para o cidadão da esquerda, o que fora bem-afortunado pelo compadre.
Poucos topes, viria depois um pisão no pé e um pedido de desculpas por parte dela. Pronto. Armara-se todo o circo. Sorrisos tomavam conta da roda, e os olhares passaram a se cruzar como se fossem velhos conhecidos, e os copos não paravam de se encher, sendo drenados aos poucos ao som de boas gargalhadas. Em certo momento, quase todos de tal roda de alguma misteriosa forma – até mesmo para o maior dos gurus – se ausentaram, e esta ficou fechada em apenas quatro presenças. Eis que um dos copos secara, e tendo uma garrafa em sua mão, a mente ardilosa maquinou seu plano:
-Mais?
O sorriso não precisava nem emitir som para dizer que a resposta era um sim.
-Seu nome?  - perguntou regando a goela com o primeiro gole.
-Martins. Mas os compadres apenas optam por Tim. E o da pequena?
-Helena. Lena para os próximos.
-E qual a sua preferência?
-Pode ser desde já Lena, pra você.
-Pela distância ou pela conversa?
-Pelos dois. – e já se ia o penúltimo gole.
-Nunca reparei na sua presença aqui.
-Pois bem, eu não costumo freqüentar este local. Às vezes venho aqui e tomo meu tônico com os amigos.
-Pois já é esta a razão, então. Sirva-se de mais, estou já por parar.
-Já por parar? Que lhe causa isso?
-A direção de um automotor me aguarda em breve.
-Não faço posse de veículo, então não me preocupo.
-Havendo a necessidade posso ceder-lhe carona.
-Mesmo? Benção para o dia. Estava a depender do bonde. Mas onde fazes morada?
-Quinta de Palmeiras. Mais um agravante de estar por parar. E tu, onde a fazes?
-Valverde. A mim só as planícies fazem paisagem.
Estes poucos cinco minutos foram mais que suficientes para afunilar a proximidade que só se reforçara ao longo do colóquio. De mentes mais soltas, os dois falavam bem mais livremente. Ele então, apaixonado pelas Vemags, reparara em sua camiseta, que ilustrava várias delas:
-Gostei desta amarela. Também da laranja, da verde, vermelha, azul...
-Pensei que fosse dizer-me que havia gostado deste, preto – disse levantando a camiseta do ombro direito e permitindo-lhe ver o sutiã.
-Gosto mais daquilo que este cobre – soltou ele, sem pestanejar.
-Calma (risos)...
Esta foi a parte que mais lhe marcou a mente na conversa. Após esta, retornaram alguns dos rostos conhecidos, e fizeram com que o encanto fosse, se não interrompido, ao menos pausado. Então as estrelas iam rolando pelos céus, enquanto chegávamos a 4:20, sinal de que a noite já agonizava. Despede se então de todos os seus companheiros, sem eleger nenhum deles como “Watson”, e vai direto à pequena, tendo deixado-a por último propositalmente:
-Até breve então, Lena.
-Até, Tim! – disse beijando-lhe calorosamente o rosto.
Mais uma vez, sem que precisasse perder preciosos segundos, sacou da indagação:
-Posso ter acesso a teu número? Apenas para que possamos mar...
-De fato. Anote-o depressa – interrompendo-o fez saber o número.
Após mais um beijo de “cumprimento”, fora se dirigindo até seu antigo Ford, o estufado Tim. Se não atingiu um grande objetivo hoje, ao menos teve uma merecida massagem ao rijo ego. O único problema é que não se sabe quando a verá de novo. Pelo menos até o momento, tal coisa não acontecera.

CONTINUA>>>